Desde quando se faz jornalismo pelo ânus?


Fábio de Oliveira Ribeiro 

O assunto é sério. Portanto, merece ser tratado com o devido rigor:

No século XIX o jornalista norte americano John B. Bogart cunhou a frase que todo mundo aprende no pré-primário do jornalismo: "se um cachorro morde um homem, não é notícia, se um homem morde um cachorro, é". https://goo.gl/dXYcx3

Ao exibir ao vivo seu ânus na TV a musa do golpe de 2016 estimulou reações curiosas. A que mais me chamou atenção partiu da esquerda moralista. Há bem pouco tempo a esquerda defendeu com vigor a liberdade de expressão quando a direita moralista atacou um espetáculo teatral em que vários artistas exibiram os respectivos ânus.

Como plataforma política, o moralismo aproxima a esquerda da direita. A distância entre os extremos diminui na proporção inversa da grande repugnância que alguns sentem ou afirmam sentir pelo órgão considerado indigno.

A reação ao ânus de Ju Isen ilustra perfeitamente o oportunismo, profundidade e correção de um vídeo de Marcelo Adnet https://goo.gl/UvPAvi. O caminho mais curto entre o intestino e a boca passa pelo debate moralista acerca do ânus.

Nosso país segue sendo desmanchando por Michel Temer como se fosse o cu do mundo. Embriagada de tanto consumir informação irrelevante, a população brasileira não reage. De fato, desde que conseguiram derrubar Dilma Rousseff os telejornalistas só fazem uma coisa: apoiar a “penetração estrangeira”. A metáfora neste caso se ajusta bem à imagem de país que domina a cena política.

Michel Temer quer entregar o petróleo e as terras brasileiras aos estrangeiros. ¡No problemo! Os jornalistas evitam estimular o nacionalismo ou se limitam a provocar reações moralistas sobre temas que não podem afetar a agenda política. O ânus de Ju Isen certamente será muito politizado. Tão politizado quanto o sexo ao vivo na piscina do Big Brother. Enquanto perdem o foco, os brasileiros vão perder seu petróleo e seu território.

Perdemos a oportunidade de transformar o Brasil num país de primeiro mundo. Ganhamos de presente imagens inesquecíveis transmitidas ao vivo por redes de TV sem compromisso público algum.

A musa do Impedimento querer mostrar seu ânus não chega a causar surpresa. Ela mesmo disse que tem uma cabeça muito boa, o que quer que isto signifique. O que surpreende é a consolidação do golpe e a desnacionalização do Brasil ocorrer no exato momento em que um ânus se torna o centro das preocupações televisivas. Ju Isen teve que virar para mostrar seu órgão excretor e o operador de câmera fez um close digno de um Oscar. A cena foi narrada como se fosse um furo jornalístico.

Gostemos ou não a cena registra mais do que mostra. A exibição ao vivo do ânus de Ju Isen é uma prova da decadência do jornalismo brasileiro. De fato, o operador de câmera mostrou algo bastante trivial: a anatomia de Ju Isen não é diferente da anatomia das outras pessoas. O ânus dela está no lugar certo e, apesar de ter sido pintado, cumpre a mesma função biológica. Se a musa do Impedimento não tivesse ânus, o furo jornalístico seria digno de um Pulitzer.

Sem querer Isen conseguiu entrar para a história do jornalismo. Ela fez algo inimaginável: mostrou que após o golpe de 2016 os telejornalistas passaram a ter o ânus onde costumavam ter apenas as cabeças vazias. Não por acaso eles defecam diariamente no respeitável público defendendo um governo indefensável.

Ju Isen também conseguiu revelar uma contradição profunda e interessante. Os jornalistas brasileiros defendem o golpe de 2016 porque o que é bom para os EUA (o neoliberalismo) também é bom para o Brasil. Todavia, o axioma do norte-americano John B. Bogart deveria ser mas não é suficientemente bom para os telejornalistas brasileiros. Só por isso o ânus de Isen mereceria receber um Troféu Juca Pato de jornalismo investigativo.

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