Luis Felipe Miguel
O teatro montado ontem pelo Ministério Público Federal teve dois destaques.
Um foi o power point apresentado por Deltan Dallagnol, com todas aquelas setas convergindo para Lula. Cada círculo incluía uma acusação sem provas ou um arroubo retórico contra o ex-presidente. Tudo primário, do ponto de vista estético; do jurídico, então, nem se fala. Mas feito sob medida para "impactar" os lobotomizados da TV Globo e entusiasmar os seguidores do MBL - que, aliás, começou imediatamente a vender uma camiseta comemorativa. Tão rápido, mas tão rápido que é possível suspeitar que estivessem avisados.
O outro destaque, claro, foi o ato falho de Roberson Henrique Pozzobon, quando confessou: “Não temos como provar, mas temos convicção”.
Dallagnol e Pozzobon se tornaram figuras notórias na Lava Jato, como procuradores particularmente desprovidos de qualquer limite ético no cerco a Lula. Como Dallagnol mistura seu trabalho com pregações políticas em igrejas, circulou a avaliação de que ele era movido por um sentimento messiânico, de que era o escolhido de Deus para livrar o mundo de Lula, do PT e da distribuição de renda. Eu não tenho como provar, mas tenho convicção de que ele é movido por razões bem mais mundanas. Já Pozzobon foi um dos procuradores que foram gravados ameaçando uma testemunha que se recusava a incriminar Lula.
O powerpoint não traz nada de novo, apenas sintetiza o discurso anti-Lula que vem sendo reproduzido há meses e meses. Mas é ele que está na capa da Folha, d'O Globo e do Estadão, em fotos enormes. A Folha chega mesmo a usar na manchete a palavra "propinocracia", criada sob medida para alimentar o discurso da direita nas redes, sem qualquer outra relevância.
A verdadeira notícia é o reconhecimento público, pelo MPF, de que as acusações contra o ex-presidente carecem de provas. Mas isso sumiu no noticiário. Na Folha, a declaração de Pozzobon não é citada em lugar nenhum (os outros eu não li). Na verdade, o nome do procurador só aparece, en passant, no editorial do jornal.
A reação dos advogados de Lula é registrada na capa dos jornais, mas de forma protocolar, sem menção aos fatos que embasam seu veredito de que o MPF apenas montou "deplorável espetáculo" (como está na capa d'O Globo). O mais bacana é que a Folha dá um espacinho na capa para uma "análise", que chega a dizer que a Lava Jato "não trouxe prova substancial" contra Lula, mas cuja chamada é "Impedimento para 2018 ganha chance concreta". A chamada está a serviço da desinformação, trocando causas por consequências. Dá a entender que afastar Lula da vida política seria um efeito colateral das investigações e não que esse sempre foi, desde o início, um objetivo central da Lava Jato, perseguido desesperadamente.